Professor Escritor e Produtor Cultural

Resumo

Este artigo tem o objetivo de tornar mais visíveis os problemas que permeiam o cotidiano escolar, para auxiliar os professores na escrita de textos que se revestem de urgência e premência, pois o ato de escrever está circunscrito na fala que ousa dizer o que ainda não está institucionalizado. Sublinho a fala antes da escrita, pois esta ação parte de significações da linguagem, não cristalizadas em conceitos fechados. 

Na escrita de um texto de qualquer segmento e gênero tem que haver algo desta fala uma pouco até idiossincrática, que alude e se insere em uma ação singular de trabalhar em prol das subjetividades.

Portanto, a partir de situações de ensino, professores/escritores precisam estar atentos em ao viés sócio ideológico da linguagem (BAKHTIN). Neste sentido, ser um pesquisador de sujeitos que está envolvido na construção de subjetividades e em suas histórias.

Introdução

O foco principal deste artigo é sugerir um caminho temático para professores que desejam relatar suas experiências e vivencias em artigos, livros e até em formas poéticas e literárias.

A base que se instaura nesta proposta é a problematização das situações pedagógicas, em uma linha de pensamento que se desenvolve, vinculada ao problema social.

Neste viés é imprescindível se desprender de objetos e conceitos prontos e centrar-se no individuo e sua singularização. Os temas que serão abordados funcionam como espécies de sugestões para professores que querem desenvolve-los. Estes temas foram escolhidos mediante a uma análise de profundidade dos problemas que permeiam o ambiente escolar. Neste sentido a abordagem deste texto será direcionada para a ética na escola; autoridade e autonomia; relação professor/aluno; indisciplina; escola e diferença; como pensar a escolaridade.

Ética na escola 

Para se começar a falar no conceito de ética será preciso uma pequena análise sobre a diferença entre singularidade e particularidade, pela urgência de sublinhar estes fatores nas questões atuais. A diferença inserida entre estes dois polos nos remeterá a questões de conforto e alienação da sociedade atual.

Na perspectiva de Richard Sennett (1988) “multidões de pessoas estão agora preocupadas, mais do que nunca, apenas com as histórias de suas próprias vidas e com suas emoções particulares; essa preocupação tem demonstrado ser mais uma armadilha do que uma libertação” (p.17).

 Podemos entender esta alegação, pelo fato de que a apreensão da realidade não é particular, ela depende de como as coisas do mundo são compartilhadas na sua profundidade e significação. Compartilhar um aspecto ou ação de minha vida particular não é significativo para uma tomada de consciência coletiva sobre um determinado problema. 

A particularização do nosso cotidiano é uma das ações mais sutis do sistema capitalista e liberal em nossas vidas, pois ser particular nos transforma em pessoas individualistas com perspectivas estreitas, vendo qualquer apelo coletivo e comunitário com desaprovação. 

A particularidade suplanta a individualidade. Engolido pelos papéis e pela imitação o individuo vive de estereotipias. A grande maioria dos homens modernos não é, portanto, individualidade, na medida em que acaba por tornar-se muda unidade vital de particularidade e genericidade (PATTO, 1999 p 174).

Os professores que se propõe a escrever e pesquisar sobre o cotidiano escolar, são colocados em um terreno que não propicia a intensa particularização da sociedade. Neste sentido não podem se deixar levar por questões particulares inscritas em contextos alienantes, pois precisam assumir um posicionamento crítico diante do fato da vida privada ser um conteúdo bastante utilizado na mercantilização das redes sociais.

 Quanto a este estado de coisas do mundo atual, concluímos com Júlio Groppa Aquino, “que é só a partir da a ação escolar orgânica (aquela voltada explicitamente aos conhecimentos historicamente acumulados, aos legados da ciência, humanidades , artes e esportes) que o acesso às informações pode ter alguma utilidade, validade ou sentido” (AQUINO 2000, p.46). 

A escrita e a pesquisa escolar ou que parte de uma experiência tem sempre estar relacionado com um cotidiano e com as singularidades dos sujeitos. Neste sentido, “a sala de aula pode ser este lugar onde o pensamento se demora por um instante a fim de deglutir, ruminar e tomar coragem para rasgar experiências repetidas, É necessário fazer de tudo isso um campo de experimentação e explicitação de humanidade que nos habita, e leva-las ao seu limite máximo, criando novas configurações humanas. Habitando, hoje, um mundo marcado pela velocidade e por uma vertiginosa exposição de imagens, precisamos de um espaço comum entre homens para nos relacionar (FRANÇA, 1996, p. 147).

Aspecto social e ideológico da linguagem

A linguagem e a comunicação configuram-se como temas propícios para muitos debates e alegações, pois  estão sempre presentes nas indagações sobre as relações sociais. Por meio da linguagem o ser humano evoluiu comunicando suas descobertas, suas aflições, seus desejos e sua história. O fundamento da linguagem que é mais urgente para compreender as relações que se instauram em um ambiente escolar é seu aspecto histórico inserido no sujeito. A linguagem no âmbito escolar precisa ser analisada como uma troca entre sujeitos históricos. 

Quando professores precisam relatar uma situação de ensino que versa sobre falas e textos dos alunos sobre algum assunto de fundo social, e estas colocações dos alunos os chocam – ora por serem agressivas, ora por serem preconceituosas e destorcerem a realidade – será preciso fazer uma análise social e ideológica do fato. No sentido de levantar os fatores ideológicos e sociais que perpassam estes textos e falas para delinear as motivações que contribuíram para seus posicionamentos.

Na pesquisa educacional é problemático quando se produz textos sem o dimensionamento social, pois parece que um evento ocorrido em uma situação de ensino está desconectado do mundo, sem relação com entornos sociais e econômicos, sem relação com lugares e sua cultura, ou seja, o evento se gere por si só, o que é impossível. 

Em uma situação onde se revela algum preconceito é preciso saber que a maioria dos nossos preconceitos, tem na verdade um caráter mediata ou imediatamente social: os assimilamos e os aplicamos através de mediações a casos concretos. A particularidade do homem está vinculada a sistemas de preconceitos pelo fato de que na sociedade predominam “sistemas de preconceitos sociais estereotipados e estereótipos de comportamento carregados de preconceitos” (HELLER, 1972, p.50)

Quando os professores intencionam se colocarem como escritores de experiências e vivencias escolares  vem a tona a necessidade da análise histórica dos fatos, para propor saídas qualitativas e quantitativas para situações problematizadas.

 Pois na alegação de Vygotsk, todo fenômeno tem sua história e essa história é caracterizada por mudanças qualitativas e quantitativas (VYGOTSK, 1984).  

Relação Professor/aluno/conhecimento – conclusão

A tríade da relação pedagógica e um tema que se abre a muitas perspectivas dentro do cenário escolar. O pesquisador pode se ater na dimensão do professor e seu papel como produtor e mediador de conhecimento e seu papel na sociedade como um todo que cobra do professor a formação ética que se espera para preparar uma sociedade futura com menos conflitos sociais e desigualdades.

Os três fatores desta tríade se complementam nesta construção futura na múltipla dimensão do conhecimento – cognitiva, valorativa, atitudinal e procedimental – que se desdobram em graus e capacidades de entendimentos, valores coletivos e societários, atitudes construtivas de professores e alunos diante do saber e procedimentos que valorizam o processo, a experiência e a vivencia. 

Neste conjunto promovido pela relação tríplice escolar, vislumbramos um futuro realmente ético para a sociedade futura, onde a relação escolar é participativa da construção de uma sociedade que terá maior representatividade em relação a extratos sociais e pautas identitárias.  Neste sentido, a escola ainda é o laboratório de uma sociedade. 

Os trabalhos de pesquisas sobre os três atores da relação pedagógica e suas devidas reformulações são necessários para professores de gerações futuras e alunos. Centrados nas acepções de Paulo Freire que supera a noção de aluno como objeto da educação no centro do processo educativo, o professor que pretende desenvolver um trabalho de pesquisa e produção de conteúdo teórico e vivencial, deve se inserir como mediador, criador, e articulador cultural dentro da relação pedagógica.

BIBLIOGRAFIA

AQUINO J. G. Do Cotidiano a ética e Seus Avessos. São Paulo: Summus, 2000.

BRANDÃO C. R. (org.) Repensando a pesquisa Participante. São Paulo: Brasiliense, 1999.

FRANÇA S. A. M. (1998) Diferenças e preconceitos: a efetividade da norma. In: Aquino, J. G. (org.) Diferenças e Preconceitos na Escola: alternativas teóricas e práticas. São Paulo: Summus, pp139 -48.

HELLER, A. O Cotidiano e a história. Petrópolis, Paz e terra, 1972.

OLIVEIRA Zilma M. R, (Org.) A Criança e seu desenvolvimento – Perspectivas para se Discutir a Educação Infantil. São Paulo: Cortez, 2000.

PATTO M.H.S. A Produção do fracasso Escolar – Histórias de Submissão e Rebeldia. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1999.

SENNETT, R. (1988) o Declínio do Homem Público: as tiranias da intimidade. São Paulo: Companhia das Letras.

VIGOTSKY, L. S. (1984) A Formação Social da Mente. São Paulo, Martins Fontes.

Pedro Guimarães – Mestre em música na área de Etnomusicologia pela UNESP. Professor de Música e Arte Educador nas seguintes Instituições: Serviço Social da Indústria (SESI); Centro de Educação Unificada da prefeitura (CEU); Faculdade Anhembi Morumbi; e Instituto Paulo Vanzolini (Formação de Professores). Músico multi-instrumentista e compositor de trilha sonora.

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